domingo, 5 de dezembro de 2010

The Walking Dead - Primeira Temporada

Lento, agonizante, brilhante

Enquanto acompanhava os primeiros episódios de The Walking Dead, não conseguia parar de me questionar: porque tanto confete em cima dessa série? O que fez ela ser a sensação entre as estréias de outono nos Estados Unidos? O que a fez ser aclamada mundialmente por críticos das mais diversas nacionalidades e tendências? 


A resposta mais óbvia e simples, após ter assistido todos os seis episódios da primeira temporada, é de que a concorrência para ela nessa última temporada era quase inexistente e qualquer programa com um pouco mais de refinamento se destacaria também. Isso, contudo, seria muito simplista e realmente não reconheceria alguns dos inegáveis méritos do seriado. 




Outra eventual maneira de responder, um pouco menos cáustica, mas um tanto mais cínica, seria apontar o fato de The Walking Dead ser um produto de "marca", que já vem com carimbo de qualidade e portanto pouco exposta a ataques mais óbvios. Isso quer dizer que se você for criticar, é melhor se esforçar e pensar bem a respeito, porque provavelmente sua crítica será ela mesma alvo de críticas. 


A série é produzida pela AMC, canal relativamente novo que abriga outros programas pelos quais os críticos já caíram de amores como Breaking Bad e Mad Men - não vi nenhum dos dois ainda, mas só ouvi falar bem. Além disso, The Walking Dead é  dirigido por Frank Darabont, o oscarizado diretor que já le levou às telas À espera de um milagre e Um sonho de liberdade, filmes que dificilmente encontram um detrator mais entusiasmado. Fora isso, a obra original em quadrinhos já alinhavou uma base de fás (nerds como eu) de vulto considerável. Havia então um quê de "não vi, mas já gostei" antes da estréia e pode ser que ninguém quisesse dar o braço a torcer depois que a realidade bateu à porta. 

De qualquer maneira, essas razões ainda que verdadeiras não seriam satisfatórias, pois ignorados dois grandes problemas estruturais, ritmo e estilo, é preciso aceitar que, no mínimo, é um trabalho extremamente competente e que há uma equipe por trás se esforçando para entregar algo de qualidade. Pesa muito contra que os problemas mencionados permeiam cada minuto, cada fala, cada cena da série, então dificilmente podem simplesmente ser ignorados: ou você está com eles, ou contra eles. 

Ritmo - Se estivéssemos falando de The Event ou Flashforward (veja que cito duas séries fracas como comparação), o que The Walking Dead apresentou em aproximadamente cinco horas, não cobriria um episódio sequer dessas duas séries. Muita ação acontece em The Walking Dead, o problema é que demora muita cada uma delas começar e até lá você pode já ter dormido umas duas vezes e mais um pouco. Essa escolha supostamente permite que os personagens sejam melhor desenvolvidos e que você se identifique mais com eles e se importe quando as inevitáveis baixas no grupo acontecerem. Para a geração MTV ou a mais recente YouTube, manter a atenção em um vídeo em que o intervalo entre mudanças de plano, cortes e eventos é contado em minutos e não em segundos é realmente angustiante. 

Estilo - Não há muito como fugir do caminho trilhado e retrilhado das realidades pós-apocalípticas e The Walking Dead entrega aquilo que todos já esperam - a política interna do grupo, o conflito gerado pelo estresse constante, a escolha entre a sobrevivência individual e a morte grupal, a inevitável necessidade de se "matar" um ente querido (depois de ter se recusado a acreditar que ele se tornaria um zumbi contra toda e qualquer expectativa), etc. Esse elemento certamente joga contra a série e o roteiro não tenta inovar em praticamente nenhum momento. Porém, a verdade é que mesmo com essa "mesmice", nós inevitavelmente continuamos a ser tragados sempre e novamente para essas realidades em filmes, jogos, livros e quadrinhos.  Se é assim, porque não se embrenhar em uma realidade que seja muito bem executada (ainda que lentamente) como a de The Walking Dead? 

O grande trunfo da série é fazer você sentir que existe uma boa equipe que já discutiu todos os buracos da trama antes que o episódio seja apresentado a você. Geralmente quando você se pergunta porque afinal de contas um determinado personagem fez algo e não a alternativa mais óbvia, o próprio se encarrega de te explicar na próxima fala ou eles podem ser mais sutis - no último episódio, por exemplo, só com o desenrolar dos eventos fica claro (ainda que subentendido) porque um determinado indivíduo, contra seu próprio instinto de sobrevivência, dividiu com outros os mantimentos disponíveis, solicitando apenas que fossem parcimoniosos com o combustível. 

The Walking Dead, como outros bons exemplares da categoria, acerta quando mantém o foco (e essa é a força também da versão original nos quadrinhos) não em como os personagens sobrevivem e sim no porque. Afinal, o que nos levaria como espécie ou como indíviduos,  dada condições extremas e pouca ou nenhuma esperança à vista, continuar lutando que não o próprio instinto irracional de sobrevivência? Os nossos relacionamento e a nossa ligação com outras pessoas pode ser tão ou mais efetivo para a nossa perpetuação que a nossa própria necessidade biológica de continuar vivos? Nisso The Walking Dead se aproxima muito do ótimo, mas também lento (além de prolixo e confuso), The Road de Cormac McCarthy. 


Pandemia, terrorismo descentralizado, sistemas colapsados e a morte definitiva da esperança: nossos maiores medos materializados na tela. 
Personagens francos e competentemente escritos e interpretados. 
Emoção genuína em meio a um cenário batido e sem muitas novidades. 

Ajuste a paciência para os intermináveis planos desprovidos de ação e curta uma das boas novidades da TV. 

Bônus: a rápida e bela (ainda que não muito original) abertura: 




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